Paris - Estação Arts et Métiers (Linha 11) - A plus
A plus (Tchau)
Viaje sem gritos e sem sujeiras. “Não
compre!”
90% dos passageiros entrevistados
reclamam do comércio ambulante. “Não compre”
Sem ambulantes a viagem será bem melhor. “Não compre!”
Não incentive o comércio ilegal. “Não compre!”
Não incentive o comércio ilegal. “Não compre!”
Se você não comprar o comércio vai acabar. “Não compre!”
Cada um tenta fugir como pode. Eu
com o livro Linhas Tortas de Graciliano Ramos, minha vizinha de banco digitando
no seu tele móvel e na minha frente duas mulheres conversam. São palavras
desconexas com gírias em excesso.
Nesse domingo pé de cachimbo acordei cedo e caminhei para
satisfazer meu desejo que nasceu ontem a tarde, de sopetão, como um aborto. Vou
para reviver um tempo que passou, como um filme já visto. Quero ver se os
personagens ainda são os mesmos. Eu continuo a mesma, quer dizer perdi muita
coisa ficou uma relação infinita, melhor nem falar. Motivação é uma. Antes era
motivada como uma cabrita. Hoje sou empurrada como uma mula. Tipo: Vai, anda, só
mais uma vez, amanhã pode ser que não mais... E assim para não me tornar
amargurada, sigo amargurada. Resmungo: Pior seria se pior fosse.
Quando comecei a caminhar pela
rua como do nada ele apareceu... Um dos
personagens, estava sentado no banco com uma criança. Na hora reconheci que era
seu filho, cara de um focinho do outro. Sua mulher estava grávida no último ano em que nos vimos... Foi antes de ele deixar a língua chinesa
e seguir para a língua francesa. Engraçado como nossos sonhos vão se
materializando em vida. E vamos vivendo
em sonhos. Estão vendo o menino ali?. Que menino? Esse ai ao lado do pai de
calça social e camisa social verde musgo... Estão sentados no banco... Não,
não, estão levantando e seguem em direção à rua. Estão vindos em minha, na
nossa direção. Vou fazer de conta que não os conheço, façam também...
Há oito anos deixei a língua chinesa.
Cheguei a essa conclusão não porque guardo datas, mas porque o pai da criança
me disse a idade do filho. Na época o pai estava deixando a língua chinesa e
foi apoiar a língua francesa. Fez isso pela dificuldade que o filho mais velho
um jovem adolescente tinha em acompanhar o pai no aprendizado de uma nova
língua. E para que a comunicação entre eles não ficasse confusa, o pai deixou
uma pela outra. Achei uma perda e tanto, pois o pai dominava o mandarim, o que
me deixava de boca aberta. Hoje quando o interroguei ele contou que também
abandonou a francesa, agora por causa do filho de oito anos. Voltou para sua
língua nativa, o português brasileiro. Por que escrevo português-brasileiro?
Porque os portugueses de Portugal fazem questão de que assim seja escrito e
dito para que seja exposto a diferença entre aqueles que seguem a risca a
pronuncia correta e aqueles que vivem em um país rebelde que esculhambou de A a
Z a língua de Camões. Ou seja, nós os brasileiros ou zucas.
Perguntei alguma coisa sem
importância a ele e ele me respondeu com duas de menor importância ainda e
assim seguimos sem ao menos olhar para trás ou trocar algum outro tipo de informação
que pudesse recordar o passado interrompido que ambos desejavam esquecer.
O senhor na tribuna a minha
frente que faz o discurso na língua francesa tem uma pronuncia agradável e
perfeita. Quase perfeita, pois aprendi a ser chata como os franceses e esperar
a perfeição que quero e que só encontrarei em Deus. Fala tão suave parece um
canto de passarinho e é tão bom, embora não entenda muita coisa ou quase nada.
Nem me preocupo, pois sei que um dia,
nem que seja na hora da morte irei dizer o abecedário de cor e salteado e não
só.
Ele se parece com um ator francês
que vi em um filme recente de Michael Haneke. É isso: Jean-Louis Trintignant.
Tem a estatura mediana, cabelos encaracolados brancos, uma pinta na testa do
lado direito, lábios finos, nariz aquilino, por volta de 65 anos... Falou de
uma guerra e de uma génération adultere e pécheresse. Com certeza é a nossa.
Alguém tem dúvidas?
Quando acabou fui conversar com
alguns e descobri que o orador é filho de franceses. Encontrei também um congolês.
Um o que? Um jovem nascido no Congo antigo Zaire país da África. Conversamos um
pouco e quando eu perguntei se ele tinha saudades da sua terra ele mudou a
expressão de alegre ficou triste e disse que sim... Descobri com essa tristeza
que todos nós ficamos tristes quando estamos longe de nosso País. Não sei por
que esse apego. Tem horas que sinto uma raiva disso. O Congo nem primeiro mundo
é. Aliás, é pior que o nosso. É considerado um dos mais pobres países do mundo.
Mas saudade é saudade. Quando perguntei se sentia falta da comida, senti sua
boca encher de água. Depois que fui ler um pouco sobre seu país me deu vontade
de dizer a ele: “Esquece, fica por aqui
mesmo, sofre aqui com a gente que dá tudo na mesma”.
Foram governados por Joseph
Desireé Mobutu. Só de pronunciar o nome sinto arrepios. Leitor atento de
Churchil, Charles de Gaulle e Maquiavel. Com o tempo adotou o nome de Mobutu
Sese Seko Nkuku Wa Za Banga, ou segundo uma tradução: "O guerreiro todo-poderoso
que, devido à sua resistência e vontade inflexível, caminha de conquista em
conquista, deixando atrás de si um rastro de fogo" Criou um tipo raro de
governo, uma cleptocracia, ou seja, um regime político-social em que práticas
corruptas, especialmente com o dinheiro público, são implicitamente admitidas
ou mesmo consagradas... Nada se cria tudo se copia, não é mesmo governo
brasileiro? Mobutu adquiriu uma fortuna incalculável. Seu longo governo se
restringiu a sufocar rebeliões, manter o país em permanente crise econômica,
dar emprego a parentes e aumentar sua fortuna pessoal - que, no ano de 1984,
protegida em bancos suíços, chegava ao valor da dívida externa do Congo/Zaire. Diante
de inesgotáveis problemas econômicos e sociais, Mobutu mostrava-se cada vez
mais incapaz de administrar as crises. A entrada no Zaire de uma imensa leva de
refugiados da etnia tutsi - vítimas de um genocídio ocorrido em Ruanda (nesse
país vizinho do Zaire, membros da etnia hutu assassinaram milhares de tutsis) e
da guerra contra o Burundi - levou a instabilidade política ao seu ponto máximo.
com o fim da Guerra Fria, o Congo/Zaire já não tinha qualquer importância
geopolítica para as potências ocidentais e Mobutu foi abandonado à própria
sorte. Em 1997, os rebeldes tutsis e vários outros grupos de oposição tomaram o
poder. Mobuto fugiu para o exílio, no Marrocos, onde viria a falecer em
setembro do mesmo ano. E, assim foi tarde "O guerreiro todo-poderoso que,
devido à sua resistência e vontade inflexível, caminha de conquista em
conquista, deixando atrás de si um rastro de fogo" de tirano oportunista, desgosto, tristeza,
impotência, descrença, descrença quanto ao futuro, sangue e mortes....
para não estender muito o assunto
Conversei ainda um pouco com um angolano e um haitiano. Mas nada se comparou com o jovem congolês. Despedi-me
deles com um a plus e sai debaixo de
um sol do meio dia em sentido a rua onde tudo se vende e tudo se compra e eu
cai no conto de um óculos o mais ordinário que já comprei em toda a minha vida
e segui em direção ao metrô. No caminho encontrei um senhor que vendia uma
raquete, e recitava uma ladainha “Mata inseto, mata inseto” Perguntei a ele se
matava políticos. Ele riu desejoso que tivesse essa finalidade. Afinal não
existe inseto pior. No trem procurei uma distração nos livros que carregava e
nas fotos que agora escolhia... Ouvia o que meus ouvidos se recusavam a ouvir:
Água, água gelada, skol.... água água água
Fone com microfone tenho de 10 a 5 real
Raus um real, raus,
amendoim doce um real, raus um real
E apareceu um cego gritando
mais alto que todos:
Algo do qual não vai
lhe fazer falta coloque em minha mão... Deus abençoe a todos
Nunca deixe faltar à visão. Se puder mais alguém ajudar, pode ajudar. Seja qual for à quantia. Nunca deixe faltar à visão. Algo do qual não faça falta coloque em minhas mãos
Nunca deixe faltar à visão. Se puder mais alguém ajudar, pode ajudar. Seja qual for à quantia. Nunca deixe faltar à visão. Algo do qual não faça falta coloque em minhas mãos
Enquanto isso em qualquer jornal nossos governantes exclamam
aos governados: “Vai tudo muito bem” como o papagaio do naufrágio.
A plus (até mais)
Marcia Lailin Mesquita - em um dia e mês do ano de 2018 do qual não lembro mais nada
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