2012 foi um ano ruim - Nunca me senti tão amada




Não olharia o relógio e nem contaria os minutos nos dedos. Ficaria olhando as pessoas indo e vindo...
E assim ficou até às 3hs da tarde sentada, estática, quase em choque, olhando as pessoas humildes que entrava e saiam daquela rodoviária em Natal/RN.
Tentou ler e fazer algumas anotações, era mais uma vitima da apatia. Quando o relógio quase marcava 4hs, pensou: Já deu tempo. Já deu tempo do dinheiro cair na conta e assim foi em direção ao guarda-volumes. Guardou suas malas e se dirigiu ao caixa eletrônico. Elas poderiam ficar ali até às 6hs da manhã do outro dia. Foi até o guichê e decidiu por Natal/Brasília. Se dissesse isso a alguém, a chamariam de louca. Depois de tanto pensar a sua bussola mental indicou esse o caminho. Era mais forte do que a razão, se é que vivia em um mundo de razão. A outra opção era esperar o outro dia, o sábado, e seguir às 13hs para o Rio de Janeiro e depois São Paulo.  O imã interno existente dentro de si, chamado coração, indicava Caruaru, Quipapá, Cupira, Jacintinho, Praia Jatiuca, Sete Coqueiros, Praia do Francês, Barra de São Miguel, Palmeira dos Índios, Quebrangulo, Pedra Pai Inácio, Chapada Diamantina, Lençóis, Arapiraca, São Miguel dos Campos, Cacimbinhas, Minador do Lucio, Alvorada do Norte, Posse, Barreiras... Não necessariamente nessa ordem... Na sua mente não existe ordem. E que importância tem a ordem no meio da desordem?

Depois de tudo feito ainda teve tempo de sair e olhar pela última vez para aquela terra insuportavelmente quente. Havia alguns carros parados e quando passou por eles um homem perguntou: "Mossoró?" Que diabos poderia querer em Mossoró? No céu um pequeno filete de lua se formava. A testemunha fiel no céu. Levaria ela como lembrança e levaria três sorrisos, de três meninas do bairro de Nazaré/RN, o resto poderia ser colocado em uma história de Stephen King. Se soubesse que tudo seguiria esse enredo, não teria vindo. Quem sabe qual é o ponto do qual não há retorno? E será que saber disso com antecedência faz alguma diferença?
Passou a tarde e a noite ali naquela rodoviária e às 4hs da manhã chegou seu ônibus vindo de Fortaleza. Mal sabia ela que ele iria entrar em vários estados, parar em várias cidades como um circular. Seria tudo muito rápido e não estava preparada para isso, se soubesse não teria dormido, não teria ficado quando acordada hipnotizada pela paisagem da estrada com o caderno fechado em seu colo e a caneta rolando em suas mãos. Sempre pensando: Mas que diabos estava fazendo ali?

Era um ônibus de dois andares estava no primeiro banco, bem de frente para a estrada, do seu lado um homem, um cearense vindo de Fortaleza, um viajante, um falador, e assim foi contando, sem ter pedido licença a história de todos os lugares por onde o ônibus percorria. Não queria ouvir só queria olhar. Via uma paisagem verde. Árvores lindas, lugares vivos, pessoas dentro de rios, dentro do mar, o sol, o calor, frutas maduras... Onde estava a seca? Onde estava a caatinga? Os pés de cactos? A falta de água?

Na rodoviária de João Pessoa subiu uma mãe e uma filha com um vestido tomara que caia. As duas tinham como destino Maceió.  Estavam à procura do pai e marido que havia vendido a casa e sumido com o dinheiro. Quando desceram o cearense acompanhou a filha com olhar até sumir de vista. Ficou olhando aquele olhar e pensou em seu pai cearense como ele e entendeu mais ainda a cultura do flerte da paquera do acumulo de mulheres ao longo da vida, da vida desregrada, da pouca vergonha e a origem do câncer de próstata. Pensou também naquele homem que ficou lá em Capim Macio no olhar que deu em seu quadril. Foi ali que seus olhos azuis esbranquiçados se fixaram enquanto se dirigiam ao elevador no primeiro dia de sua chegada... 

O ônibus fez o caminho do mar e ela teve o privilegio de admirar uma paisagem estonteante. Mas foi em São Miguel dos Campos/AL que entraram duas pessoas, Suzana e seu padrasto que iriam mudar o seu trajeto o fascínio e a importância  daquela viagem. Iam para Quebrangulo visitar o avô que estava doente. Quando disseram Quebrangulo, seu coração pulou. A cidade de Graciliano Ramos!


Eram quase 4hs da manhã quando nosso ônibus vindo de Fortaleza/CE parou em uma rodoviária e vi subiram três pessoas, duas mulheres e um homem. Não perdendo de vista nada que se passassem diante dos meus olhos, me fixei de modo interrogador no semblante pensativo de uma jovem senhora vestida de calça cotton e camiseta lilás. Tinha os cabelos amarrados em um coque desfeito. Observei-a detalhadamente enquanto o motorista colocava duas malas vermelhas dentro do bagageiro. O tempo todo ela estava de cabeça baixa. Foi só quando caminhou para a entrada que virou o rosto olhando em volta parecendo procurar alguma coisa, percebi os olhos vermelhos de chorar. Então subiu as escadas e se dirigiu para o fundo. Foi só uma curiosidade. O ônibus deu a partida, eu puxei a manta virei de lado fechei os olhos e dormi. Eram 8hs, acordei com o ônibus parando para o café da manhã. Percebi aquela mulher da madrugada descendo e pedindo ao motorista que abrisse o bagageiro. Vi quando tirou uma blusa e um par de meias. Segui-a com o olhar enquanto se dirigia ao banheiro da lanchonete e então desci e fui até a lanchonete tomar meu café. Já tinha passado questão de 15 minutos quando ela o motivo da minha curiosidade entrou. Havia uma cadeira na mesa em que eu estava ela perguntando se estava vaga sentou. Não falou mais nada. Permaneceu sentada e como que abstrata sob a fumaça dos meus pensamentos que se formavam cada vez mais preenchendo o espaço entre nós duas.
Posso escrever minuciosamente o instante, pois casualmente olhei para o relógio: os ponteiros passavam 20m das 8hs, naquela manhã do dia 26.02.2012, estava inteiramente absorta por aquela história que logo mais eu tinha certeza de que iria se formar de maneira doce e intensa.
Foi logo após sentar no meu banco o primeiro do ônibus, que ela se aproximou e perguntou se tinha alguém sentado ali no lado. Disse isso, e sem esperar minha resposta  explicou que estava sentada no meio do ônibus debaixo do ar condicionado e havia sentido muito frio naquele pedaço de noite.  Respondi a ela que o senhor que ali estava tinha descido na parada anterior, e que ela podia ficar ali se quisesse. Ela foi buscar sua bolsa e logo voltou. Era uma manhã linda, o ônibus estava entrando em Maceió. Ela com sua máquina tirava fotos da paisagem e assim a viagem seguia sem trocarmos uma palavra ate a cidade de São Miguel dos Campos quando entrou um senhor  e sua enteada. Sentaram no banco vago próximo a nós. Aquele senhor tinha a curiosidade humana que é a verdadeira ocupação das pessoas simples, e assim ela começou a desdobrar-se, não só ela, mas todos ali e os que estavam no banco atrás se procuravam e contavam parte de suas vidas, de onde vinham e para onde iam e foi naquela noite que começamos a ouvir a história que levou Elisa para Natal/RN e o que a fez voltar tão rapidamente.


Tinha olhos castanhos escuros, cabelos claros, lábios grossos, sensualmente cerrados, como se houvesse um sorriso fechado pronto para sair há qualquer hora. Nesse momento ela se adiantou um pouco para tirar uma foto da praia dos sete coqueiros, e aborreci-me comigo mesmo. Eu fantasiava muito mal: tudo era diferente; tudo era quase escandalosamente diferente da minha visão! Não usava um vestido de crepe rodado; não era magra e sim cheia de corpo e de quadril largo e na sua face procurei um sinalzinho de beleza; os seus cabelos eram secos e quebradiços ao invés de macios e sedosos. Cada vez mais cheio de detalhes ia se tornando esse retrato e comecei a sentir essa mulher estranha, que visível estava do meu lado, como um filme revelado na minha retina.
Foi um pouco mais tarde, com a linda visão do sol se pondo no horizonte bem em nossa frente que Elisa começou sua história. Tinha uma voz bonita de se ouvir, falava com certo acento estrangeiro, muito tranquila e pausadamente. Ergui-me e ela não me viu, no momento em que batia mais uma foto do por do sol. Foi então que eu deixei cair a agenda que estava em meu colo no chão próximo a ela. Ela me olhou surpresa, um clarão sorridente passou pelos seus olhos tristes, e os lábios se abriram num sorriso iluminando todo o seu rosto em cores vivas. 


 Vou contando em partes, em forma de personagens, como uma peça de teatro. Da forma que escrevi, da mesma forma que ouvi. Desculpem os erros gritantes de português, é a primeira vez que sento perto de uma máquina dessas. Não estou acostumada a digitar em um teclado e nem sei como fazer a correção.

(Elisa) – Peguem os lenços!
(MA) – Eu ainda acredito no casamento no papel, com pompas e circunstâncias! Assim eu quero o meu próximo! (rindo)
(Laís) – Casamento eu não sei se quero, mas matar um eu sei que ainda
quero (Risos)
 (MA) – A minha história também requer lenços! Conta a tua Elisa depois eu conto a minha. Assim todos usam o mesmo lenço e economizam (Risos)
(Elisa) - Referente à minha vinda para Natal, devo dizer que ainda esta tudo muito confuso em minha mente. Vou tentar destrinchar em doses homeopáticas é claro, pois ninguém é de ferro e nem eu. Tudo começou quando fiquei doente. Foi no meio do ano passado. Para me livrar da dor passava longas horas deitada de bruços. Ficar de bruços era a única posição suportável.  Arrumei um companheiro para as noites em claro: um computador. Comecei fazendo um blog e depois fui atrás de amigos virtuais e encontrei o facebook. No início, tinha um certo receio dessa vida virtual, por ouvir muitas histórias, mais negativas do que positivas. Mas quando se fica doente, sem ninguém com quem conversar, a coisa se torna difícil de controlar. A solidão se tornou um sentimento bem doloroso.  Provoca um sentimento de vazio, de isolamento, de estar fora do convívio de outras pessoas.  Estava me sentindo vulnerável e assustada. Já se sentiram assim?
(Onofre) - Acredito que todo mundo de uma forma ou de outra já se sentiu assim
(Elisa) - Passava as noites em claro, sentindo dor. E foi em uma noite dessas que recebi uma solicitação de amizade. Depois de analisar o perfil, aceitei sua solicitação e não lembro mais de muita coisa. Deveria ter anotado... Mas não esqueço as músicas. Lembro delas e das poesias... Conversávamos no bate papo. Na época eu não estava muito a fim. O seu perfil, o estilo das conversas, eram um tanto chulas, me aborrecia, e eu passava grande parte brigando com ele. Já sabia de cor qual seria a cantada e a sua forma. Uma animação apenas, nunca uma excitação. Era um sinal. Por que não dei ouvidos?
Ei tem alguém ai. Vocês estão acordados?
(Mariana) – Bem... Eu estou acordada por enquanto... Só vendo ate onde você vai chegar.
(Elisa) – Eu vou chegar ao bairro de Nazaré, foi lá que meu sonho terminou. Bom, voltando.... Eu estava presa em uma cama, com câimbras terríveis na perna. Não encontrava alguém que me ajudasse. No banho se o sabonete caísse lá ele ficava porque abaixar era impossível. Tornei-me uma pessoa infeliz. Queria morrer. Mas não podia dizer isso. Isso seria uma violência para comigo e uma falta de agradecimento para com o dador da vida. Comecei a pensar o quanto seria bom ter alguém, alguém para segurar minhas mãos quando a dor fosse maior do que eu, alguém que passasse as mãos pelos meus cabelos, tarde da noite e dissesse: “Não se mexe não gatinha, eu vou esquentar a água para a bolsa”. Dia vai, dia vem, ele postando poesias. Dias indo, dias vindo ele postando músicas e eu compartilhava e os dias foram passando até o dia que ele sumiu... Ei, tem alguém ainda ai ou eu estou falando com meus botões?
Era uma música de Serge e Jane Birkin, não fazia muito meu estilo. Preferia mais um piano, um violão... Mas, aprenderia a gostar. E acho que aprendi a gostar. Um dia ele sumiu. Sua pagina existia, mas as postagens estavam paradas em um único dia e assim ficou por um, dois dias, meses ... Não respondeu mais minha mensagem, por talvez dois meses. E eu também resolvi sumir... Mas depois um dia fui procurar e ele havia voltado. E começamos a nos falar novamente. E ele disse o quanto ficou doente também e o quanto eu fui importante em sua cura. Chegou até a escrever isso em seu blog, me agradecendo, mas hoje se alguém for lá não encontrara mais. Ele mesmo eliminou. Foi um agradecido por pouco tempo, muito pouco tempo.
Desculpem-me pessoal preciso dar uma parada para pensar um pouco (Enxuga as lagrimas com a blusa)
(MA) – As coisas que a gente faz por amor
(Suzana) - É mesmo!
(Onofre) – A história esta interessante... Continua...
(Suzana) – Eu não quero dormir, gosto de olhar a estrada, e está bom ficar aqui  ouvindo você falar...
(Elisa) – Começamos novamente a nos falar. Agora ele estava diferente. Mais sério. Contou sobre as mudanças que fez em sua vida. Duas dela eu presenciei: tirou a barba e no dia 01.01.2012 parou de fumar. Assim quando ele disse que queria passar os próximos trinta anos comigo, eu acreditei. Quando disse pra minha filha que cuidaria de mim eu acreditei. Quando disse que me amava, eu acreditei... E que estava atarefado comprando uma cama de casal e passávamos longas horas no Skype discutindo se a cama entraria ou não no quarto onde estava o computador ou no outro... E que faria massagem em meus pés, nas minhas pernas em minhas crises de dor, e que me amaria...
E que não conseguiu dormir naquele dia em que quis colocar uma rede na sacada e imaginou que eu poderia cair lá embaixo... E que estava preocupado com minha comida. Será que eu comia carne? E que não via a hora de me abraçar. E que não era um aproveitador, iria casar comigo. Quem em seu juízo perfeito seria capaz de rejeitar tanto. Hoje acho que todo mundo. Como eu posso chamar isso... Alguém ai me ajuda............................................ (Silêncio)....................................
É foi isso... Eu não resisti... Os dias foram passando. Mas não passou muito porque aprendemos a eliminar dias e assim pulávamos dois dias e contávamos um. E um dia, depois de meses de dor, de espera, morfinas, tylex, facebook, La decadense, Serge e Jane, e La decadense, não resisti e disse SIM. Sim eu iria.
Posso continuar? Ma, você esta ai com seu lenço?

(MA) – Continua estou acompanhando
(Elisa) – Bom vocês devem saber que um relacionamento virtual é frustrante. É um corpo ressequido, como diz a música de Marisa Monte.
Assim, sonhando alto, quando já não havia mais papel e nem tela para anotar tantas promessas, combinamos que iria. Ele disse que se o dinheiro não fosse suficiente ele me ajudaria. E enquanto minha família estava de férias eu fazia planos. Comprei passagem somente de ida e quando meus familiares chegaram eu já estava com as malas prontas, não pensei duas vezes, disse somente: estou indo!

(Onofre) – Pô, Elisa, você não respira para falar (risos)
(Laís) - Não atrapalhem, deixem nossa Sherazade terminar.
(Elisa) - Arrumei todas as minhas tranqueiras (quase) em duas malas abarrotadas que ultrapassaram os quilos que eram permitidos e fui feliz da vida. Afinal era noiva, já tínhamos até colocado em nossa página, e agora iria casar. Acho que foi um sonho e esse sonho sempre irá me perseguir. Desliguei o telefone a TV paga, guardei meus livros, escondi alguma coisa para ninguém pegar e fui. Isso foi no dia 11 de janeiro. Dia 11 de janeiro eu fui. Repito só para vocês não esquecerem. Estava lá no céu há mais de não sei quantos mil pés, olhando as nuvens, tirando fotos da cidade lá embaixo, da asa do avião. De algum ponto no horizonte... Pensando no futuro que estava logo ali em frente, e que o alcançaria dali duas horas. Somente duas horas. E se o avião caísse eu estava pouco me importando porque estava indo por uma boa causa e viver ou morrer valia pena e, não sei mais o quê. Então o avião pousou em um aeroporto simples. Longe, quase no fim do mundo. Acostumada que estava com as coisas grandiloquentes. Me senti chegando em um campo de alguma fazenda do interior. Minhas malas foi uma das primeiras a chegar. Eu não tinha pressa. Ele não estava sozinho. Não poderia chegar e correr e me jogar em seus braços. Seu filho estava lá com ele. E ele já havia perguntado ao pai: “Quando ela vai embora”. Ele havia me dito isso. Ele não era nenhuma criança. Ele tinha três filhos. Todos balzaquianos. Sua ex-esposa havia lhe dito: “Eu aguentei 37 anos, será que ela aguenta um mês?”. Tentava não pensar nisso. Mas isso ficava no ar martelando como mau agouro.  Tentei arrumar meu cabelo que estava solto, coloquei os óculos escuros para esconder meus olhos fundos de uma noite em espera... E atravessei o corredor em sua direção
Na próxima parada acho que vou descer e me arrumar um pouco.
(MA) - Acho que você está ótima assim.
(Onofre) – Concordo que você desça e se arrume, mas estou ansioso para o fim da sua história. Estou acompanhando como um conto, você fala de um modo interessante, fico imaginando como seria no papel, dá vontade de seguir até o final da história.
(Elisa) – E quando comecei a olhar as pessoas em pé esperando no aeroporto... Encontrei-o com seu filho 

logo no inicio da multidão, meu coração parou e pensei: “Fecha os olhos e finge que não é”. Seu filho estava 

de carro e nos levou ate seu apartamento. Algo que de inicio tínhamos combinados que iriamos de taxi. No 

nono andar do seu prédio ele demonstrou de onde vinha tamanha prontidão. Só foi embora depois que seu 

pai assinou um documento como fiador para suas vaidades. Se houvesse uma bola de cristal ou uma cigana, 

não teria dado importância. Como não dei  importância ao relato de Andrea Cristina in box... No nono andar, fixei os olhos na direção do horizonte e era tão bonito de se olhar. Não o concreto ali na minha frente, mas o que deve ter sido aquilo ali no século 18 ou 19. Como todo lugar que dizem ser paradisíaco, ele se torna paradisíaco dependendo do modo de olhar. Olhe sempre para frente, para o mar, não olhe dos lados e nem atrás e muito menos no fundo. Feche os olhos e escute o barulho das ondas, o vento gostoso em seu rosto e esqueça o sol devastador ou a sujeira acumulada pelos moradores e vendedores espalhados de ponta a ponta..................
Seu filho demorou para ir embora.... Ficou lá enrolando. Queria algo e iria aproveitar a ocasião. Parecia uma chantagem. Ficou lá...
Impedindo o abraço e o beijo.......... Quando finalmente saiu nos jogamos um no braço do outro..... Beijamo-nos no instante em que ele fechou a porta e tentamos fazer amor com o sol batendo na janela, a cama coberta apenas com um lençol azul e limpo. Tentamos fazer amor com pressa, porque não conseguíamos esperar... Possuir um ao outro e depois ficar transpirando lado a lado. Ficar olhando um para o outro, sorrindo e exclamando: "Eu te amo". Só tentamos. E continuamos tentando os dias que se seguiram.
(Mariana) - Você esta querendo nos dizer que ele não deu no couro? Ele era impotente?
(Lais) - Realmente, você foi parar em uma ilha deserta e o cara...
(MA) - Mas por que ele não fez um tratamento? E por que ele não te disso sobre isso? Que barra!
(Onofre) - E ele tinha vontade de fazer amor?
(Elisa) - Tinha. E eu não me importei. No primeiro dia achei que... Bom, ele arrumou algumas desculpas, e eu não sei até hoje qual é a verdadeira. E outra, é um assunto que não entendo bem e se ele quisesse realmente ser ajudado teria pedido ajuda. Estava sem saber o que fazer, mas isso não era o fim do mundo, não para mim e depois, fui descobrindo suas qualidades. E já que estava ali poderíamos aproveitar de alguma maneira. E foi o que fizemos. Tentamos. Nas minhas dores ele fazia massagem em minha perna, e colocava minhas meias para esquentar meus pés. E se o sabonete caísse eu poderia pedir a ele. Ele estava sempre ali, sempre amável... Eu o abraçava e esperando ouvir: "Eu te amo". Ficava esperando repetir os planos que fizemos para quando chegasse. E eu tinha pensado como seria. Tinha pensado na roupa que usaria e eu não tinha esquecido os documentos... A certidão de divorcio, o documento de identidade, a minha máquina fotográfica para registrar os melhores momentos.... Mas ele não , ele esqueceu de tudo o que foi dito.

Eu tinha registrado em minha mente como seria... Pegaríamos duas testemunhas. Duas pessoas na rua... E depois compraríamos champanhe e iriamos até o mar e molharíamos os pés enquanto nos beijaríamos com as ondas em nossos joelhos e ele passaria as mãos em meus cabelos e eu diria pela centésima vez que não tinha importância, que isso era sem importância. Procurava ver seus esforços. Dia 30 de dezembro, depois de 40 anos fumando, ele havia parado de fumar. Havia tirado a barba... E depois eu nunca iria precisar arrumar desculpas tipo: "Estou com dor de cabeça". Ele sempre me olharia... Não ele nunca me olharia mais profundamente. Coisa difícil para um homem. Mas é uma coisa que afinal eu, talvez nunca vou saber. Mas as noites eram maravilhosas. Para isso bastava levantar o corpo e olhar na janela. logo ali na cabeceira da cama... Não a claridade das luzes... A claridade da lua... A testemunha fiel no céu... Grande majestosa, ali do meu lado atravessando o céu. Eu afastava o lençol e sentia vontade de voar e depois descer lentamente no mar... Fechar os olhos enquanto meu corpo caia no mar, cinzento escuro, com suas águas agitadas com um cheiro pútrido...

(Elisa) Havia desejo mas não ocorria a ejaculação. E eu não sei se tinha dó ou se não estava nem ai afinal o problema era dele e, se havia esse problema porque se submeteu a essa situação? Vocês que são tão bem instruídos viajados vividos e o mais. Saberiam cientificamente me explicar? Tá certo que o problema também acabava sendo meu mas eu poderia ao menos ter sido alertada de antemão assim teria feito uma pesquisa a respeito. Agora estava eu lá naquele fim de mundo sem bons livros, sem uma USP, sem amigos, sem nada. Tinha que dizer: Ah, isso não é nada, quem sabe até o final do ano eu ganho um presente no natal. Tinha que dizer algo engraçado. Ai, que situação.
(Suzana) - Realmente, você foi parar numa ilha deserta e o cara... Parece ate a piada do fanho....rsrsrs
(Ma) - Eu ia ao banheiro, mas nem vou mais, vou dar um tempo. Estamos justamente no tico tico no fubá kkkkkkkkkkkk
(Elisa) - Assim os dias foram passando. Eu fazia as coisas rotineiras como varrer a casa e colocar as coisas em ordem. Ele fazia o que lhe cabia como dono da casa e eu hospede. Eu gostava de olhar pela janela era diferente, a visão era diferente. Não era a mesma de um prédio da Av Paulista. Quando penso não sei se realmente era diferente ou se são meus olhos minha mente acho que vejo diferente. Não sei o que tem minha mente. Às vezes sinto ela dando uns curtos e meus olhos veem uma claridade algo dourado explodindo. Ainda morro disso. E os dias corriam. Eu não deixava de ir até a sacada olhava para baixo para a piscina e perguntava a ele: Onde estão as crianças? Ele dizia que estavam em férias. Eu não entendia umas ferias tão prolongada. Desconfiava disso
nunca acreditei em felicidade em um lugar onde não há crianças.
(Lais) - Mas é nesse tempo o que mudou no relacionamento?
(Elisa) Quase duas semanas nesse lenga lenga e nada. Ele que tinha parado de fumar depois de quase quarenta anos fumando... Uma noite encontrei  na sacada fumando
Estava tão feio sua pela tinha escurecido naquele momento e seus olhos suas mãos
não eram ele. Era uma mentira. E agora? Não suporto falta de compromisso com aquilo que se fala. Por quase duas semanas havia cumprido com sua palavra. Mas isso também era um problema dele sempre respeitei os gostos e opiniões mas era algo bem desagradável, não bastava nunca mais ter tocado no assunto; casamento e nunca mais ter ouvido a palavra: eu te amo agora isso. Estou com sono com muito sono e vocês também estão cansados. Percebo pelo silêncio. Acho que o ônibus todo está me ouvindo.  Bem, eu estava ali no fim do mundo, mais um pouquinho tocaria meus pés na Europa eu tinha mais é que fazer de conta que não vivia aquela vida. Deixa eu ver se consigo resumir um pouco.  Agora ele virava as madrugadas na sacada fumando e eu dormindo, não ia ficar fumando com ele. Chegou dia 11, e ele nem lembrou que nesse dia fazia um mês que eu estava ali. Esquecer datas é algo tão chato ainda mais
quando é importante pelo menos para mim.
(Laís) - Homem quando vira as madrugadas na sacada fumando, é porque quebrou, baby.
(Elisa) - Mas não disse nada. Vivia uma crise mental que só ele sabia. Lembrei de uma postagem dele antes de sumir do face em que dizia: “Tá, amigos, me desculpem: não tô legal! Acho que, dentro de uns 30 dias tudo voltará "ao normal". Não é possível que essa maldita depressão se arraste por mais que esses presumíveis 30 dias! Não guento mais que isso! Grande beijo!”
Devia estar passando pelas sequelas daquela crise. Domingo dia 12/02, ele estava estranho, eu disse a ele que iria sair... Iria ate a praia e ele nem sei se disse algo. Talvez tenha Aproveitado a ocasião para os preparativos finais. Foi meu último passeio no mar do atlântico.


Voltei e tudo aparentemente tranquilo. Depois ele ficou em um computador e eu em outro cada um fazendo alguma coisa.
(Lais) -  Só num termina esse romance lavando a louça, vai cortar o meu barato....rsrs
(Elisa) - Na segunda feira acordei estranha aquela sensação de não estou legal, minha pressão... Um certo pânico e o dia foi passando e a noite chegando e chegou a hora em que ele disse: algumas coisas que nem é bom lembrar e depois disse o que me fez pegar minhas malas e arrumar minhas coisas. Disse que o espaço era pequeno para nos dois
E foi me ajudando a pegar minhas coisas e isso era quase 8hs da noite. E eu não sei o que deu nele. Mas ele parecia feliz de se ver livre de mim. E eu acho que fiquei em choque. Primeiro porque não sabia para onde ir, depois porque ele se propôs a pagar minha passagem, mas eu não poderia viver aquela palhaçada, não junto com ele.  Se era para viver uma palhaçada iria viver sozinha era bem mulher para isso.
(Ma) - Não, você é quem está feliz de ir pra casa . Eu estou feliz por você estar indo embora. Espera lá, pagar sua passagem era o mínimo! Palhaçada foi a outra coisa.....aquela do primeiro dia...:)
(Elisa) - Ele talvez não acreditando ou não sei o que depois de tudo isso depois de eu ter pego as duas malas... E enchido com minhas tralhas ele foi no extra comprar algo pra comer ou sei lá talvez estivesse faltando sabão em pó, óleo de cozinha, a dispensa estava vazia. Não sei. Sei que fiquei ali sentada na cama e ele saiu.  Eram 20:35m sei disso porque sou uma detalhista e quando ele saiu deitei na cama e chorei por pouco tempo, porque ai tive uma ideia tinha na bolsa o cartão do motorista de taxi que havia me lavado até a praia um dia ele me deu o cartão porque eu pedi para o caso de precisar novamente, lembro que tinha trocado algumas palavras com ele e havia dito que tinha vindo a trabalho e esse trabalho não deu certo não poderia dizer que tinha conhecido um desconhecido na internet e tinha saído da minha casa onde estava não tão bem instalada
mas era a minha casa e tinha ido lá para os confundo do judas atrás de uma aventura ou não sei que nome se dá a isso.
(Mariana) - Você quebrou alguma coisa? Eu quebraria...
(Lais) - Conta mais desse motorista...
(Elisa) - eu toda afobada com somente 18 reais na bolsa e nada no banco fui toda atrapalhada. Segurei a porta do elevador e fui jogando tudo dentro... Temendo ser encontrada por ele pelo caminho. Deixei a chave na portaria e entrei no carro. No banco da frente pedi a ele que me levasse a um lugar onde houvesse gente a noite toda gente que não dormia...  Eu não conseguia me expressar direito, nem formular as ideias
a única coisa sensata que contei a ele é que não tinha dado certo a minha vinda para aquela cidade.  Não suportei e estava saindo e precisava que ele me deixasse em um lugar onde houvesse gente.  Porque eu precisava passar a noite toda em algum lugar e amanhã quando amanhecesse iria ligar para São Paulo e naquele momento eu não tinha um puto no bolso e amanhã quando o sol queimasse eu iria ligar para  São Paulo e pediria para  a Imobiliária  depositar o dinheiro por antecipação ou sei lá o que eu disse porque eu não conseguia mais segurar as lágrimas e estava ficando aflita com toda essa história. Vocês estão ai? 
(Lais) - Como assim, você não aceitou a passagem e nem o dinheiro dele? Eu estou abismada...
(Elisa) - Não aceitei a passagem e nem o dinheiro dele e não me arrependo
(Lais) - Mamma mia, 18 pila...
(Elisa) - Depois de dizer isso, o motorista mudou a rota e me levou até a rodoviária.
 Chegando quase lá, disse que não me deixaria dormindo em um banco dentro da rodoviária e me levou a um hotelzinho de quinta categoria. Eu não poderia desejar algo melhor. Estava de bom tamanho. Ele disse que estava fazendo isso por mim porque viu, sentiu que eu era uma pessoa boa e assim pagou a noite para que eu ficasse naquele abafado quarto onde eu tive a pior noite de minha vida. Antes ainda perguntou se eu não gostaria de ficar por ali, arrumar um emprego, trabalhar, ele me ajudaria, ficou falando e eu olhando e imaginando... E quando o táxi estava quase chegando ele sugeriu ficar comigo no quarto, e eu amavelmente disse não, enquanto carregava as malas quase tropeçando nos degraus com tanta pressa que tinha, acabei esquecendo a mesinha do computador, a única lembrança que eu levava da cidade. Disse que ligaria no outro dia, não liguei e nunca mais vi seu rosto.

A pernoite ali custou R$ 28,00, e na manhã seguinte acordei passada e, como ainda tinha um prazo ate o 


meio dia fui andar para conhecer a região. A rodoviária estava ali em frente. O que fazer? Tinha que pensar,

raciocinar com calma. Entrei dentro de mim pra saber como andava minha pressão, se havia algum sinal de

surto e vi 
que estava tudo normal, existia preocupação, frustração, mas não desespero ou pânico. Pronto, me dirigi até a rodoviária e comecei a formular um meio de viver minha espera. Iria encontrar alguém. Entrei e comecei a olhar. Foi quando avistei uma senhora com uma revista e uma Bíblia na mão. Fui até ela...   E assim, fiquei  ali no bairro de Nazaré  esperando o dinheiro de SP, que demorou uma semana e quatro dias mas isso é uma outra história e agora Sherazade irá dormir. Boa noite a todos. 
(Lais) - Boa noite Sherazade... Amei ...


Todos se viraram suspirando fundo. Elisa ainda pensou por alguns instantes antes de cair em um sono profundo não sentindo mais o balançar do ônibus e não ouvindo mais uma voz fraca e distante dentro de si: “Eu não te disse? Você não sabe nada. Confiar nas pessoas dá nisso. Pensa que o que não aconteceu até então não pode acontecer?”  Fechou os olhos e dormiu profundamente. Depois de uma semana e quatro dias em por um triz, agora o mar tão calmo. Depois de quarenta e cinco dias de chuvas e ressecas o mar estava calmo. Ela gostaria de ter se despedido do mar. Afinal ele foi o seu companheiro. Mergulharia até o fundo. Até o limite total de suas forças. De longe deu adeus.
Adelaide A


Comentários

Mano Melo disse…
Muito linda sua narratiwa. Densa. Li tudo de um folego só. Amei os interalos com fotos. Seu conto daria também um belo filme, é tudo muita imagem, muito cinematografico. Já wiajei muita wezes de øonibuspara o nordeste e sei como comunicação entre os passageiros se faz, logo no início da jornada todo mundo se faz íntimo e trocam sua histórias, contam piadas, riem e choram juntos. Seu conto me deixou emocionado, e até pensei que conheço este poeta da história, mas não ouso dizer o nome dele, por não querer quebrar nem a sua intimidade nem a dele. Wocê é uma mulher muito corajosa, que mergulha de boca na ida e a saboreia com oracidade. Isro às ezes machuca, faz doer no plexo solar, mas que desinteressante seria a ida sem essa intensidade! Um beijão pra ocê. Assinado: Mimoso Quasímodo, o jumento quasumano.
marcia mesquita disse…
Querido Jumento
fiquei esperando esse jumento para assim poder sair de Nazaré, aquele fim de mundo esquecido por Deus. Aliás tudo ali é assim... Mesmo vcs na época não acreditando em tudo o que eu vivia, entrava em contato via internet com cada um do grupo, sei que sabiam mas preferiam que fosse algo do tipo: Foi agora se vira
E eu me virei em minha integridade e caráter. Bjs

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